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30/03/2012

MEMÓRIAS - ACERCA DE MIM





Zé Antunes e meu
irmão Fernando



                Zé Antunes,  Fernando  e meus pais                  


     Meu pai e nós os quatro Bº. Pop  


               Meus pais na Sonefe em Luanda                  



PRELÚDIO - Vou tentar sintetizar os meus passos em Angola, mas acho que não consigo. Contudo começo por dizer que sou retornado, e também refugiado. Sou europeu porque o meus antepassados o eram, mas sinto-me africano pelos 20 anos mais importantes da minha vida vividos em Angola, a maior parte deles em Luanda.

José Antunes Gonçalves, também conhecido por Zé Antunes ( Russo ), nascido na Póvoa de Penafirme - Santa Cruz – Torres Vedras, em Maio de 1955, no seio de uma família normal – somos 4 irmãos ( Zé Antunes, Fernando, Victor e Amélia) - lá está a história de não haver televisão, ou se calhar, a minha mãe levava a religiosidade muito a sério - cada gravidez, cada parto.

O meu pai, per si, também pertencia a uma prôle normal - 6 irmãos (Manuel, Madalena, Branca, meu pai Júlio, Delmar e Esperança).
Minha mãe também com família dita normal - 5 irmãos (minha mãe Carmitas, Alice. Lourdes, Zé Martins e Victória).

Não nasci rico, pois o meu pai quando nasci já se preparava para emigrar para Angola, a vida em Portugal era muito difícil na época, embarcou no navio Niassa em Setembro de 1956 tendo passado esse natal já em Cambambe, com o seu trabalho conseguiu ter uma vida estável e educar os filhos dando-nos ferramentas para termos melhores condições de vida, a quando da independência de Angola, lá ficou a moradia da família, no Bairro Popular nº 2 e mais os dois automóveis ( um Opel Kadete e uma carrinha Datsun) lá ficaram em Angola, com o José Agostinho o “bom moço”, que foi fuzilado a quando do Golpe do Nito Alves em 27 de Maio de 1977.

A MENINICE - Fui para Luanda em Janeiro de 1957 . Vivi a minha meninice na Barragem de Cambambe (Alto Dondo), para onde fui com 20 meses de idade e nesse tempo o meu pai trabalhava na Barragem de Cambambe, e tenho poucas recordações desse tempo por ser ainda criança. Sei de algumas passagens por ouvir minha mãe contar.

TEMPO DA GUERRA - Em Maio de 1960, fomos residir para o Bairro São Paulo, indo depois para o Bairro da Cuca em Luanda, e lá vivemos o inicio do "tempo da guerra". O meu pai sempre ligado há Empresa Sonefe. Moravamos numa casa que era do Calisto e da Maria, que foram mais tarde padrinhos de batizado do Victor. Lembro-me dos militares, pois andei muito nos jipes Willy's e Jipões da tropa portuguesa e, albergámos na nossa casa muitos militares de patente alta e suas esposas pois a casa tinha imensos quartos - parecia uma pensão!!! O Bairro da Cuca era um Bairro bem grande, já tinha naquele tempo um Clube Social, um Posto de Combustivel, Escola Primária, Colégio “João de Deus”, a fábrica de cervejas “CUCA” tinha uma piscina (Cacimba de águas paradas ) onde morreu um amigo meu com 7 anos ( ficou preso no lodo )!!! Quando o meu pai dizia - vou sair - nós nunca sabíamos se ia na carrinha Austin para a cidade de Luanda ou se ia para alguma povoação do Norte de Angola!

ESCOLA PRIMÁRIA - Em 1962 fomos residir para O Bairro Popular nº2 Luanda. Ai fiz a instrução primária. Estivemos lá até 1975. O meu pai trabalhava como encarregado de obras na “Sonefe” minha mãe tinha uma banca de legumes no Kinaxixe, Frequentei a Escola Primária nº 176, no Bairro Câncio Martins, vulgarmente conhecido por Bairro Popular nº, 2, hoje chamado de Neves Bendinha ( páraco de Luanda que foi o estratega da revolta do dia 4 de Fevereiro de 1961) é como se fosse hoje, recorda-me da escola e da minha primeira professora Srª. Professora Fernanda, pessoa respeitável 1ª e 2ª classes depois Srª. Professora Amélia 3ª e 4ª classe. Escola nova moderna com características arquitectónicas do Estado Novo, mandada construir pelo governo de Salazar. Toda a estrutura principal era de alvenaria, amplas salas de aula e sanitários num recinto coberto para nos intervalos das aulas nos abrigarmos quando chovia. Tenho bem presente na memória que nas salas de aula na parede por detrás da mesa da professora, havia dois quadros: um com o retrato do Presidente da República na altura Américo Tomáz e do Primeiro Ministro Dr. Oliveira Salazar. No centro um crucifixo. Nas paredes laterais da sala de aulas havia quadros, não me lembra quantos, os chamados quadros de Salazar. Recorda-me apenas de dois que ficaram, não sei porquê, gravados na minha memória. Num deles do lado esquerdo via-se uma velha escola e o professor bêbado. Os alunos insubordinados saltavam pelas janelas para a rua. Do lado direito viam-se as escolas tal como aquela que eu frequentei. O outro era um quadro onde, do lado esquerdo, se via um automóvel da época talvez um Ford circulando numa estrada toda cheia de buracos. Do lado direito as estradas novas mandadas construir pelo Governo de Salazar. Recordo, também, que num recital feito na escola se exaltavam os quadros de Salazar. A mim coube-me dizer a introdução: "Os quadros de Salazar são a mais alta lição que ao Mundo se pode dar à Grei e a toda a Nação". E, naquele tempo, assim foi. Em Luanda havia pelo menos quatro dessas escolas, com classes mistas .

ESCOLA SECUNDÁRIA - Terminado o estudo primário (4ª classe) fui matriculado na Escola Preparatória “JOÃO CRISÓSTOMO” que, naquele tempo, foi inaugurada nesse ano, ano de 1967/1968 ainda tinha turmas masculinas e femininas, depois transitei para a Escola Indústrial António Oliveira Salazar de 1968 a 1973. terminando o meu curso de Formação de Serralheiro, ( Desenhador de Máquinas, Desenho de Construção de Estruturas Metálicas e Desenho de Construção Civil ), para no futuro ter mais algumas possibilidades de emprego, tendo ainda frequentado à noite a secção preparatória.

ADOLESCÊNCIA INTERROMPIDA - De 1973 até 1975 empreguei-me na “Represental “ Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, Lda, Lembro-me das Farras, do Moto-cross, do primeiro namoro … lembro-me bem dos gelados do Baleizão, dos pregos do Pólo Norte, dos pirolitos das "quitandeiras", da Luta Livre no Circo na D. João II, do Estádio dos Coqueiros, dos "karts" do Lobo da Costa, das corridas de carros na Fortaleza, do "conjunto" musical Os Rúbis. Nas tardes quentes de Verão fazíamos gazeta ás aulas e íamos tomar banho ás praias na Ilha de Luanda ou à Piscina de Alvalade, as jovens costumavam tomar banho vestindo apenas as camisas interiores de Verão que, com a água, ficavam transparentes e pegadas aos corpos e nós, já rapazotes, aproveitávamos para dar uma espreitadela e apreciar com volúpia a intimidade dos seus esbeltos corpos.

FUGA PARA A "SELVA" EUROPEIA – Junho de 1975, já quase não haviam amigos no Bairro, a maior parte veio para a Baixa de Luanda e outros tinham ido embora, de carro, de barco ou de avião. As ruas de alguns bairros de Luanda, pejadas de mortos. O meu pai tinha que ziguezaguear para não os pisar. Era a caça ao homem. Nós que sempre acreditámos que ficaríamos. Um amigo de meu pai o “Belito” que mais tarde foi assassinado no golpe do Nito Alves, dizia Sr. Júlio, fique porque aqueles que saírem vão ter dificuldades em regressar. Infelizmente o Belito não tinha razão. Hoje vai mais depressa para Angola um tuga que "não gosta de pretos", tal como os russos (e lá faz o sorriso amarelo para os explorar) do que um (genuíno) angolano como meus irmãos que nasceram lá. E eu que lá vivi desde menino.
Ficam por contar os episódios inimagináveis desta "Selva" e as catanas que tive de afiar para desbravar mato e sobreviver aqui no Puto, como se fosse um dos exploradores Serpa Pinto, Hermenegildo Capelo ou Robert Ivens quando se aventuraram no mato verdadeiro e das savanas de Angola. Morando em Lisboa , onde vivo com a minha esposa Marinha Ribeiro (São Ribeiro), ela Angolana oriunda de Sanza Pombo distrito do Uije, terra dos grandes cafezais residente desde menina também no Bairro Popular nº 2.


1956

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