Este texto foi-me deixado em herança, narrando a viagem que minha mãe fez descrevendo os seus sentimentos e experiências!
Para quem viveu em Luanda, reconhece sem muita dificuldade todos os pontos descritos e até vividos que aqui transcrevo...
Minha mãe saiu de Lisboa numa tarde de uma Terça feira de Janeiro de 1957. Com ela viajava eu com 20 meses de idade.
No cais, repleto não só de passageiros, como também de pessoas amigas e familiares, despediam-se dos que seguiam viagem. A figura maravilhosa do "Niassa" que, acostado e com as bocas dos porões abertas engolia toda a carga que as gruas teimosamente lhes oferecia, parecia enorme, há muito para carregar, a partida estava marcada para as 16 horas.
O grande navio "Niassa" que fez uma viagem extraordinária, tem a lotação esgotada. Passageiros que tinham acabado de gozar umas merecidas férias, outros que tinham vindo em serviço e ainda muitos colonos que iam tentar nova vida para as provincias ultramarinas. Fez-se noite está mais fresco, as gruas continuam a transportar carga do cais para o paquete.
Pelas 20 h 30 m o belo "Niassa" começou a largar, depois de já terem servido o jantar. No dia 13, ao levantar-se pelas 07 horas, avista as Ilhas Canárias. O navio atracou em Puerto de La Luz em Las Palmas da Gran Canária ás 08 horas. Depois de um passeio pela ilha admirando maravilhosas paisagens e belas praias, fez como é hábito de todos os passageiros algumas comprae e voltou para bordo. Por volta das 15 horas o barco largou do porto para prosseguir viagem.
No dia 20 pela manhã alguns passageiros pensavam ver já Luanda. Pairava uma incerteza sobre a hora da chegada, mas de Luanda nada se via. Só por volta das 11 horas se descortinou terra, mas não era a cidade mais 30 minutos e lhe dissertam:
-Lá está Luanda !
É impossivel descrever aqui a péssima impressão que minha mãe ficou da capital da provincia. Da amurada do paquete, onde se encontrava desde manhã muito cedo, como que querendo ser a primeira a avistar terras de Angola, ficou com uma impressão desagradável daquelas barrocas com mais de 50 metros de altura, de terra barrenta e avermelhada sobre o casario, conferindo asim um aspecto desolador à cidade. Pensou para com os seus botões:
-Onde me vim meter?!!
Mas esses morros vermelhos escondiam a verdadeira e bela cidade de Luanda!!!!!
á passava 30 minutos do meio dia quando o navio atracou num local do porto demasiado pequeno para a capital desta tão grande provincia portuguesa. Podem atracar apenas seis barco de longo curso. À chegada muito aperto, o espaço é pequeno e há muita gente esperando no cais pessoas de familia, amigos, etc, etc.
Depois das formalidades legais, começou o reboliço a bordo, procurando moços para que as bagagens pudessem sem demoras serem desembarcadas. Aqueles corpos negros, brilhantes de suor e mal cheirosos de "catinga" eram poucos para , de um momento para o outro, satisfazerem os muitos passageiros que ficariam em Luanda.
Minha mãe não foi das últimas e só se despachou ás 14 horas.
Esperavam por ela e pelo Eng. José Manuel Lopes ( que também fez a viagem ) o sr. Eng. José Macedo Vitorino da Empresa SONEFE, a quem minha mãe ia dirigida e que a informou o mais possivel para que as dificuldades do momento fossem contornadas sem prejuizos. No seio da multidão encontrava-se ainda a esposa e os filhos do seu futuro compadre e muito amigo Sr. Figueredo de Mello que mais tarde seria padrinho do meu irmão Fernando.
Depois já fora do cais, pressentiu que mofavam dela pela desambientação e do traje europeu envergado em pleno calor tropical.
A cidade de Luanda que se esconde por detrás das barrocas, é realmente uma grande cidade.
Após a saida do porto, o Largo Diogo Cão mostra a Avª. Paulo Dias de Novais ou Marginal, abraçando a baia, a linda baia de Luanda, com um azul limpo e vistoso, onde baloiçavam barcos de recreio, navegavam pirogas de pescadores e apareciam alguns praticantes de vela. Em toda a marginal rodeada de bonitas palmeiras, erguiam-se os principais arranha-céus, produto de forte aplicações de capitais de ricos comerciantes e fazendeiros. Depois a sucessão de majestosas vivendas de linhas ousadas e, por todo o lado modernos blocos de apartamentos.
Ao fim desta larga marginal a fortaleza de São Miguel e, para quem a visita, uma visão incomparável da cidade e da ilha do Cabo que, por ser ligada por uma pequena ponte, tornava-se numa peninsula com as suas caracteristicas vivendas, a velhissima igreja Nossa Senhora do Cabo e, mais afastada, a mancha do Parque Florestal.
No carro do seu amigo Sr. Figueiredo de Mello deram um passeio pela cidade, atendendo sorridente e sempre com muita simpatia a sua curiosidade sôfrega. Subiram ao Forte de São Miguel, onde pôde então regalar a sua curiosidade com a bela, a maravilhosa e apaixonante paisagem da cidade.
Percorreu com a vista todas as elegantes moradias com os seus bonitos jardins.
Seguiram para a Avª Mouzinho de Albuquerque, perto do Cemitério do Alto das Cruzes ( Ingleses ). nunca pôde esquecer o que este amigo fez para que ela tirasse a má impressão que ficou em principio da cidade.
Sairam de Luanda por volta das 09 horas do dia 21 de Janeiro. Minha mãe, eu e o motorista o Justino Silva. O Sr. José Macedo Vitorino deslocava-se mais a esposa numa carripana da Empresa que ia carregada com diversos mantimentos.
O calor já se fazia sentir, por volta das 10 horas passaram em Catete que dista de Luanda 60 kmºs. sempre por uma boa estrada.
Depois de duas horas de marcha ao meio dia, para que o estomago não os atormentasse mais, e por que eu também choramingava por ter fome, almoçaram no Zenza do Itombe que dista de Luanda 126 kmºs.Quarenta e cinco minutos foi o tempo suficiente para degustação de tão apetecivel almoço.
Novamente em viagem pois o Justino ainda tinha 75 kmºs para percorrer e a maior parte do percurso por péssima "picada" pois que não se pode chamar a um caminho de carro de bois, como se diz no puto.
Depois de Cassoalala, chegam à vila do Dondo, que é banhada pelo rio Quanza, onde fizeram uma paragem de pouca demora, o tempo suficiente para o Justino beber uma Cuca fresca, pois que a garganta e o organismo já algum tempo lhe pedia uma bebida gelada que lhe matasse a sede.
~Havia seis horas de viagem... ás 15 horas, novamente em marcha directos à Barragem de Cambambe. chegaram as 15 h 30 m .
O sol que até ali os atormentava com os seus raios quentes, cobre as grandes ramadas das árvores, como que querendo descansar naquele "colchão" verde e abundante. Ao longo vê-se umas queimadas naquele capim alto. Mais para além, uma fita vermelha indicando a estrada que seguiriam e que parecia tocar o céu, perdendo-se para lá....
Escuta-se o lindo cantos das aves, que parecem querer saudar-nos. Para lá daquele mato, quantos animais selvagens? Não se sabe.
O Camião seguiu em marcha reduzida, devido aos buracos da estrada. É este, apesar do calor o melhor trmpo para se viajar em Angola. No entanto a natureza reveste-se de maior esplendor, proporcinando paisagens deslumbrantes no tempo das "chuvas".
O pôr do sol começa, banhando tudo com uma cor avermelhada. Os grandes imbondeiros lançavam sombras que mais pareciam teias de aranha de grande tamanho. Ao volante do grande e pesado camião, o amigo Justino, sempre bem disposto.
A ele minha mãe agradeceu, pela primeira vez, ter visto um pôr de sol no mato de Angola. Chegam à Barragem de Cambambe, onde se encontrava já meu pai, o Sr. Raminhos e a Dona Aninhas que viriam a ser grandes amigos. Minha mãe fez uma viagem de Luanda a Cambambe de 200 kmºs .onde já passou a noite na casa junto ao Rio Quanza comigo e com meu pai.
1957
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