TuneList - Make your site Live

30/10/2013

“ARRE, QUE TANTA BESTA É MUITO POUCA GENTE”!


Disse o ilustre crítico e ensaísta literário Dr. Eduardo Lourenço: “Em que espelho se deve olhar a multidão de seres que perdeu o sentido de tudo, até mesmo o sentido do sentido? Se se olharem nos espelhos paralelos do seu próprio desespero sem finalidade, receberão na face a álea sombria e interminável de figuras gesticulantes e desatinadas como eles próprios”.

Estamos realmente a perder o sentido de tudo, num desespero de revolta e ódio, inimagináveis…porque estamos, constantemente, acusados de termos vivido acima das nossas possibilidades. Por isso cortam-nos no salário, e aumentam a idade da reforma. Acusam-nos de privilégios que nunca tivemos, metendo na gaveta “direitos adquiridos” porventura supérfluos. “Sacam-nos” os subsídios: férias e o décimo terceiro mês, flexibilizando despedimentos, rasurando feriados, aumentando impostos e rendas de casa, diminuindo o tempo de férias. Querem nos tirar agora os nossos fiéis Amigos - os nossos cãezinhos - pretendendo com isso roubar-nos a estabilidade emocional, impossibilitando-nos do convívio da sua presença e da paz, que estes seres, meigamente, nos oferecem. Que justiça é essa? Que mais facilmente condena um “pilha-galinhas”, do que um criminoso de colarinho branco. Cortam-nos na saúde, para garantir a saúde financeira dos bancos e as mordomias dos seus administradores. Mas está tudo bem! Como podemos justificar que está mal, se mais facilmente os portugueses se envolvem à pancada por causa de um jogo de futebol do que por este estado de coisas?
 
Como podemos sequer supor que a injustiça social seja um facto, se mais facilmente os portugueses se excitam com tricas domésticas entre figuras públicas, do que com o assalto de que são diariamente vítimas? O arrivismo que recrudesce é proporcional ao caciquismo que se instala, com suas oligarquias cada vez mais protegidas por um poder económico absolutamente desligado da sociedade. Um povo que vê tudo isto e entra no sistema, pedindo favores a toda a hora e alimentando a máquina que tanto critica…

“…Arre, que tanto é muito pouco! / Arre, que tanta besta é muito pouca gente! / Arre, que o Portugal que se vê é só isto! / Deixem ver o Portugal que não deixam ver! / Deixem que se veja, que esse é que é Portugal! / (...) Arre! Arre! / Oiçam bem: ARRRRRE!”
Álvaro de Campos (heterónimo de Fernando Pessoa)

 
Cruz dos santos

2013

 

2 comentários:

  1. ...que não se esperem mudanças nas atitudes e sentires destas gentes.

    Os portugueses são mesmo "...o melhor povo do mundo" (disse o outro para gozar com eles)! Podem ser roubados, manipulados e vilipendiados, mas desde que tenham pão e circo (http://pt.wikipedia.org/wiki/Panem_et_circenses), está tudo bem...

    Arre, que o Portugal que se vê é só isto!

    Parabéns pelo artigo!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Os portugueses são mesmo "...o melhor povo do mundo" isso é verdade, um pouco masoquistas mas.............Quanto mais me bates mais eu gosto de ti!!!!!!

      Eliminar