A esplanada do Barracuda, a última antes da ponta da ilha e logo depois da Praia dos Russos, era o corolário de um percurso de catorze quilómetros de praias magníficas, (sete para cada lado) de apelidos sugestivos, imaginativos, folclóricos e algumas vezes mordazes. A esplanada suspendia-se sobre a praia, e abarcava não mais de dezoito a vinte mesas, rijamente disputadas pelos poucos afortunados que podiam pagar absurdamente, até para os padrões Europeus, a eficiência e um serviço de restaurante de qualidade máxima, numa cidade onde à grossa maioria faltava o mínimo. A visão deslumbrante do reflexo do Sol Africano no mar cálido, onde, não raro, se avistavam numerosas famílias de Golfinhos, convidava a mergulhos frequentes ou à contemplação entremeada de conversa fácil. As kivitas, que ficavam ali na praia, as mais bonitas mulheres de Luanda vinham à Esplanada da Barracuda banhar-se de Sol, preparando a pele para impressionar nas noites da “Discoteca do Hotel Panorama.”
Esplanada da Barracuda
Madié Joaquim Belo ( Quimbel ) era da malta UÍ, ( diziam-se não ser hippies) aqueles que se vestiam de túnica branca e tinham como lema “Make love not war” desde 1968, com as revoluções estudantis e com os festivais de Woodstock, virou anarquista. Contestavam tudo e todos, a maioria era do contra, mas com paradoxo não deixavam de viver a vida dos pais e dos amigos, foi o boom da moda hippie, e ele dedicou-se ao artesanato, que cá fora no passeio da Barracuda, de banca montada vendia as suas criações feitas de missangas e arames, bem como as roupas, com lantejoulas, aos visitantes e a muitos turistas.
Maio de 1975 dia 28, dia solarengo, com uma temperatura a rondar os trinta graus, e na minha hora de almoço sempre que podia ia até a ponta da ilha e entabulava uma conversação com o madié, Quimbel ficava deveras feliz por ter os amigos ao seu redor.
Em frente ao Barracuda existia um Largo de terra batida onde se fazia a inversão de marcha, nesse Largo existia mesmo defronte ao Barracuda um quiosque de baleizões ( sorvetes ).
Eu era amigo do Quimbel desde os tempos da Escola Indústrial de Luanda. Nesse dia fui até á ponta da ilha, e ele ao me ver aproximou-se de mim e com toda a lenga lenga, que o negócio estava mal e que estava sem comer, cravou-me logo uma vintena ( nota de vinte escudos ).
Nesse espaço de tempo aproximaram-se de nós dois elementos das FAPLAS, que integravam as tropas de intervenção, que rondavam nos carros Hanimogs , junto da tropa Portuguesa e dos outros movimentos, aproximaram-se e já vinha com ar ameaçador e exigem ao Quimbel que lhes pague um Baleizão.
“ Como é camarada!! Pagas ai um baleizão para nós” !!!!
“ Não tenho cumbú, pedia aqui ao meu avilo Banga Zé uma nota para para os morfes, e além do mais não ando a roubar” !!!
O que o Quimbel disse!!!!!!!!
Exército Angolano ( Faplas )
Os madiés das FAPLAS, ficaram furiosos, engatilharam em simultâneo as kilunzas (kalashnikov), Quimbel quando vê o aparato, quase se urina pela calças a baixo. A tropa Portuguesa que integrava essa tropa de intervenção, nem mexeram uma palha, ficaram impávidos e serenos.
Quimbel todo nervoso e cheio de medo justificou-se:
Calma meus avilos eu sou Mangolé e sou da Paz, não quero maka nenhuma, me desculpem ai então.........
Estes brancos colonialistas, pensam que ainda estão na terra deles, vêm aqui ofender, fica bem, olha que estamos de olho em ti, vais–te portar bem, senão..........te varremos com estas mesmo que estás a ver aqui ( eram as kalashnikov ).
Quimbel arrumou as suas bicuatas, que estavam na Banca em frente ao Barracuda, ainda ofereceu uns colares de missangas aos madiés das FAPLAS para eles oferecem ás namoradas, esperou por um amigo que tinha um chiante e bazou, só parou mesmo nas Ingombotas, onde residiam os pais.
Ai eu falei com os madiés das FAPLAS, desculpando o QUIMBEL.
Olha aí, o madié é nosso avilo é um pouco malaiko, não lhe vistes as farrapeiras que vestia, saiu-lhe mal a resposta que te deu, e é verdade eu lhe dei uma ventoinha para ele comer uma sandes , estaca com bué de fome.
Estamos juntos, estou um coche atrasado, vou bazar para o meu salo, ainda tenho que bumbar toda a tarde, fiquem bem.
Peguei na torraite e bazei direitinho ao Largo Serpa Pinto onde estava o meu estaminé.
Praia da Barracuda
Nessa noite no Bairro do Café no TUTTI FRUTAS, falei com o Quimbel e ele o que me disse, foi .....
Porra meu. Vi a minha vida a andar para trás , me mijei todo quando engatilharam as armas, esses FAPLAS não brincam em serviço.
Eu falei então, a partir de agora com esses madiés tem que dar a gasosa, pois aquilo lá na ilha foi para te amedrontar, para ficares com cagunfa.
Claro que o tema de conversa de toda a noite foi o Quimbel, quase se mijando todo, fartamo-nos de rir perdidamente com a situação.
Quimbel com um ar mais sério disse..........
“ Os cotas estão a pensar ir para o Puto, vou com eles não dá mais para viver aqui. Certo é que mais tarde encontrei o Quimbel em Lisboa e claro está que nos fartamos de rir com a história, os planos dele era ir com os pais para o Canadá, o que acabou por acontecer.
Até hoje fica esta recordação do Barracuda.
ZÉ ANTUNES
1975
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