ZÉ ANTUNES
Para o blogue
LUANDA TROPICAL
Junto envio-te um trabalho, que me deu a maior felicidade de redigir, por ter conseguido transpor para o papel, toda a inspiração sentida, em defesa dos mais necessitados.
Portanto, com um forte ABRAÇO, dos que são maiores que os braços - longos e leais - como a verdadeira Amizade que sempre nos tem unido, remeto-te a crónica, que é uma espécie de chamada de atenção aos senhores governantes deste parco país, à beira-mar soterrado.
Enquanto se confrontam todas essas excelências, com argumentos repetitivos e embelezados de uma filosofia já gasta, discussões parlamentares e debates televisivos (que não aquecem, nem arrefecem), e se diverte o “pagode” com as telenovelas e o “lixo” da “casa dos segredos”…Do outro lado da rua, milhares de pessoas vivem na miséria, dormindo em caixotes de cartão que lhes servem de casa e as calçadas de cama. Mora ali a miséria coberta pelas esquinas, habita entre nós, envergonhada pela fome. Rostos de gente esfomeada, de deportados, massacres chegam aos nossos sofás, aos nossos maples, às vezes em tempo real, quanto mais não seja por intermédio de ecrãs televisivos, entre duas doses de publicidade. Marchas, manifestações contra a Austeridade, contra a corrupção, contra as injustiças, contra os despedimentos e impostos…O desastre está em marcha, perfeitamente específico. A sua principal arma é a rapidez com que se insere, a capacidade de não inquietar, de surgir com naturalidade e como algo de inerente. Obedeceremos à interdição que nos afasta de angústias estagnantes, simultâneas às nossas vidas. Esqueceremos como é longo, lento, supliciante, o tempo que a infelicidade destila nas veias. Não detetaremos o sofrimento vergonhoso de estar a mais, de incomodar. O terror de ser inadequado. Do “mau aspeto” e do “mal vestido”. A lassidão de ser tratado como um estorvo, mesmo por si próprio, representado por um “batalhão” de Desempregados. Onde o mais nefasto (mais grave) não é o desemprego em si, mas o sofrimento que engendra e que provém, para muitos, da sua inadequação com o que o define. Angústia desses “excluídos”, dos que estão em vias de o ser e acerca dos quais nos esquece, nos esquecerá depressa que estão desesperadamente inscritos, cada um deles, com um nome, com uma consciência, ainda que nem sempre com um “domicílio fixo”. Cada um preso desse corpo que necessita de alimento, abrigo, cuidados, sobrevivência e que dolorosamente os subjuga. Lá estão eles, com as respetivas idades, os punhos, os cabelos, as veias, o estômago. Com o seu tempo deteriorado. O seu nascimento, que ocorreu e que foi, para cada um deles, o começo do mundo, o limiar do tempo vivido que os conduziu à atual situação. Olhares de adultos pobres e de velhos pobres – mas ainda se pode saber que idade têm? Olhares sem esperanças. Muitas vezes, não há pior angústia, pior tremor que a esperança. Portanto, instaura-se o esquecimento. Impõe-se, cada vez mais, a distância em relação aos outros e sobretudo a dos outros, que deste modo se furtam à angústia de talvez terem, um dia, de fazer parte do mesmo lote. Ninguém quer identificar-se com sombras que perderam a identidade.
E cá estamos num mundo novo mas, esfarrapado, defraudado e amordaçado, dirigido por essas potências segundo sistemas inéditos, e no seio do qual, agindo e reagindo como se nada se tratasse, onde continuamos a sonhar, em função de uma organização e de uma economia que deixaram de funcionar. A nossa passividade deixa-nos nas malhas de uma rede política que cobre por inteiro a paisagem planetária.
Deste teu Amigo, e sempre ao dispor
CRUZ DOS SANTOS
E cá estamos num mundo novo mas, esfarrapado, defraudado e amordaçado, dirigido por essas potências segundo sistemas inéditos, e no seio do qual, agindo e reagindo como se nada se tratasse, onde continuamos a sonhar, em função de uma organização e de uma economia que deixaram de funcionar. A nossa passividade deixa-nos nas malhas de uma rede política que cobre por inteiro a paisagem planetária.
Deste teu Amigo, e sempre ao dispor
CRUZ DOS SANTOS
2013
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