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24/05/2012

PRIMEIRO DIA DE TRABALHO

Ao jantar do dia 31 de Julho de 1973, fiquei a saber que  iria trabalhar no  gabinete de projectos da Represental, Lda. onde trabalhava um Eng. amigo de meu pai, que tinha acertado tudo com o patrão, começaria no dia 1 de Agosto. Ao que parece, havia uma espécie de protecção para as pessoas que quisessem trabalhar eram logo colocadas, não havia falta de emprego em Luanda nessa altura. Foi um pouco violento para mim, pois não cheguei a ambientar-me a nada, foi chegar e começar a trabalhar. Eu não estava preparado. No dia seguinte, comecei a ambientar-me. Confesso que fiquei bastante assustado, pois não era como andar na escola, era mais profissional. Era tudo tão diferente, tão belo, mas tão assustador. Percebi que, desse eu um passo em falso, e poderia perder o emprego.
Os dias lá começavam mais cedo e acabavam também mais cedo. Às 5 horas da manhã amanhecia e às 18 horas começava a anoitecer. Os serviços começavam a laborar às 8 da manhã.
Não é fácil descrever o que senti quando via a baixa de Luanda. Era uma cidade linda e moderna, com prédios altíssimos. Um deles, com 22 andares, tinha no cimo um anúncio ao Banco Comercial de Angola. O prédio para onde fui trabalhar, e onde funcionava também uma Repartição da Fazenda ou seja das Finanças, tinha 10 andares, ficava em frente ás Obras Públicas na Rua Conselheiro Júlio de Vilhena nº 32 (no largo Serpa Pinto).
A empresa em que eu comecei a trabalhar era uma empresa vocacionada para Empreendimentos Turisticos e Imobiliários. Tinha 12 empregados, dos quais apenas 6 europeus, os dois patrões, eu, a Maria Angelina e  a secretária Maria de Lurdes, e o Luis Filipe que tinha chegado de Lisboa. A relação entre todos era muito boa, todos eram afáveis e educados comigo, com a excepção do gerente, o senhor Manuel Cartaxo Martins, que era um homem rude e grosseiro. Todos me tratavam muito bem, até o Simões, o estafeta do escritório, bom rapaz, muito atencioso, sempre pronto para nos ir buscar aqueles maravilhosos gelados na hora do lanche. Apreciava, em particular, os gelados de manga e de maracujá, macios, deliciosos. Recordo ainda quando alternávamos o lanche e pediamos para nos trazer pregos no pão, feitos de bifes pequeninos, que não se viam fora do pão, mas tão deliciosos e tenros, acompanhados de uma coca cola gelada! Quantas vezes já tentei comer aqui esses pregos, mas é pura ilusão, não consigo, de todo em nenhum bar preguinhos iguais.
E eis que eu, um rapaz, que tinha saído da escola, sem outros hábitos de trabalho, fui desempenhar a tarefa de tirocinante de desenhador. Não minto se vos disser que me custou muito adaptar-me à minha nova vida. Foi bastante violento para mim, em todos os aspectos, pois nem mentalmente fui preparado para essa função, foi chegar e começar. E era bastante rigoroso. Levantar às 7,15, almoçar às 12 horas, lanchar às 15, jantar às 19,30, ir ao cine são João ver um filme ficar com os amigos no Bar do Matias e ir para a cama às 24 horas!
Não tinha por hábito tomar café, nem pela manhã nem depois do almoço.  Não será difícil, por isso, imaginar que muitas vezes me dava uma moleza sentado ao estirador devido ao hábito que tinha desde sempre (dormir a sesta), e depois do almoço era fatal. Era um sono incontrolável, nem lavar a cara o atenuava. Tomar um café começou a ser um dos meus vicios. Que saudades senti, Deus meu, da liberdade que até então tinha tido, das aulas e principalmente das  idas a praia e a piscina. Sentia-me como um pássaro dentro de uma gaiola. Mas o meu lema é desistir nunca e, sózinho, sem ajuda, tentei arranjar forma de me adaptar. Claro que foi muito duro, meus primeiros dias como trabalhador, posso dizer-vos que achei mesmos aterrador, psicologicamente, para mim. Mas depois com o passar do tempo e ganhando rotinas fui-me ambientando e já me sentia como peixe na água, ia convivêndo com os colegas da Empresa e com muitos outros de outras Empresas com o qual criei boas e sólidas amizades.

Zé Antunes
1973

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