Julho 1975
A grande maioria das memórias que guardo são agradáveis, algumas até contêm situações cómicas. Isso não quer dizer que não guarde também algumas memórias tristes. Esta contou-me meu pai que só regressou em 25 de Outubro de 1975, e também quero deixá-las aqui, ao que passarei a narrar.
Esta situação ocorreu num dia de Julho de 1975. Era sábado e o meu pai foi buscar o Agostinho à Avª dos Combatentes, levantou-se bem cedo e foi, o Agostinho que era seu Ajudante da Obra na Estrada de Catete, estavam a executar a futura imprensa Oficial de Angola, Sábado calmo , foram tomar o mata-bicho ao café Mónaco, ali na Av. Dos Combatentes, ao pé da Alameda D. João II. Do outro lado da rua ficava a delegação da Unita.
Estavam sentados à mesa, mandaram vir uns galões e torradas e como o café estava praticamente vazio, nem tiveram de esperar muito. De repente, estavam a saborear o seu primeiro pedaço de torrada, ouviram muito barulho, e qual não foi o espanto, quando viram, através das vidraças do café, aparecerem 2 tanques de Guerra! Seguiu-se um ruído ensurdecedor, explosões ! O mundo estava seguramente a terminar, mas nem tiveram tempo de se assustar porque o meu pai, apercebendo-se de imediato do que se estava a passar, atirou-se , mais o Agostinho ao chão, com galões, torradas e tudo! Em boa hora o fez, pois no momento seguinte, as montras de vidro estilhaçaram e a parede por trás das cadeiras onde estiveram sentados ficou cravada de balas !
Por esta altura, os outros clientes e os empregados também já estavam no chão. No entanto, o meu pai apercebeu-se rapidamente que não era possível ficar ali. Os disparos dos tanques iam na direcção oposta, mas o tiroteio da Unita vinha na direcção dele. Além disso, eles tinham começado a atirar granadas, tinham de sair dali o mais rapidamente possível ! Arrastaram-se pelo chão, foram lentamente avançaram em direcção à cozinha do café. Não era fácil, havia vidros partidos por todo o lado, e nem gatinhar podiam! Meu pai disse-me que pareceu que levou um tempo infinito a chegar às traseiras do Mónaco, mas provavelmente foram só uns minutos ! Mas a luta estava bem acesa e não havia hipótese de sair do edifício em segurança. Ficaram à espera de um momento de calma que finalmente chegou. Saíram a correr para a Rua de el-Rei D. Dinis e só pararam quando já estávam bem longe ! Foi uma época muito difícil em Luanda, Foi ai que foi destruída a Delegação da Unita em Luanda e foi também nesta altura que desapareciam pessoas que nunca mais eram vistos, nem vivos nem mortos !
Houve imensas ocasiões no período antes da Dipanda em que tiveram de parar na estrada e meterem-se debaixo do carro para escapar ao tiroteio, mas esta foi uma das únicas vezes em que meu
A grande maioria das memórias que guardo são agradáveis, algumas até contêm situações cómicas. Isso não quer dizer que não guarde também algumas memórias tristes. Esta contou-me meu pai que só regressou em 25 de Outubro de 1975, e também quero deixá-las aqui, ao que passarei a narrar.
Esta situação ocorreu num dia de Julho de 1975. Era sábado e o meu pai foi buscar o Agostinho à Avª dos Combatentes, levantou-se bem cedo e foi, o Agostinho que era seu Ajudante da Obra na Estrada de Catete, estavam a executar a futura imprensa Oficial de Angola, Sábado calmo , foram tomar o mata-bicho ao café Mónaco, ali na Av. Dos Combatentes, ao pé da Alameda D. João II. Do outro lado da rua ficava a delegação da Unita.
Estavam sentados à mesa, mandaram vir uns galões e torradas e como o café estava praticamente vazio, nem tiveram de esperar muito. De repente, estavam a saborear o seu primeiro pedaço de torrada, ouviram muito barulho, e qual não foi o espanto, quando viram, através das vidraças do café, aparecerem 2 tanques de Guerra! Seguiu-se um ruído ensurdecedor, explosões ! O mundo estava seguramente a terminar, mas nem tiveram tempo de se assustar porque o meu pai, apercebendo-se de imediato do que se estava a passar, atirou-se , mais o Agostinho ao chão, com galões, torradas e tudo! Em boa hora o fez, pois no momento seguinte, as montras de vidro estilhaçaram e a parede por trás das cadeiras onde estiveram sentados ficou cravada de balas !
Por esta altura, os outros clientes e os empregados também já estavam no chão. No entanto, o meu pai apercebeu-se rapidamente que não era possível ficar ali. Os disparos dos tanques iam na direcção oposta, mas o tiroteio da Unita vinha na direcção dele. Além disso, eles tinham começado a atirar granadas, tinham de sair dali o mais rapidamente possível ! Arrastaram-se pelo chão, foram lentamente avançaram em direcção à cozinha do café. Não era fácil, havia vidros partidos por todo o lado, e nem gatinhar podiam! Meu pai disse-me que pareceu que levou um tempo infinito a chegar às traseiras do Mónaco, mas provavelmente foram só uns minutos ! Mas a luta estava bem acesa e não havia hipótese de sair do edifício em segurança. Ficaram à espera de um momento de calma que finalmente chegou. Saíram a correr para a Rua de el-Rei D. Dinis e só pararam quando já estávam bem longe ! Foi uma época muito difícil em Luanda, Foi ai que foi destruída a Delegação da Unita em Luanda e foi também nesta altura que desapareciam pessoas que nunca mais eram vistos, nem vivos nem mortos !
Houve imensas ocasiões no período antes da Dipanda em que tiveram de parar na estrada e meterem-se debaixo do carro para escapar ao tiroteio, mas esta foi uma das únicas vezes em que meu
Pai sentiu medo de verdade, confessou ele !
Júlio Inácio
1975
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