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03/06/2012

SERVIÇO MILITAR ( INSPECÇÃO )

Quatro  meses depois de fazer 18 anos apresentei-me  no  D.R.M. de Luanda,  em Setembro  de 1973, para fazer a inspecção militar e ao qual me concederam um número  113609113 /73  e o nome pomposo de mancebo apurado para todo o serviço militar, enquanto esperava a incorporação, fazia a minha vida normal,  era para ir para Nova Lisboa  fazer a Recruta no  “R I 21” em Janeiro de 1974, por ser residente em Luanda fiquei à espera de incorporação,  e fui de férias nesse Julho de 1974

                                  Malta que esteve na inspecção militar Setembro de 1973
DEBAIXO DE FOGO
Estava há cerca de quinze dias na casa da Dona Clotilde  alugada  (  penso que seria do Administrador de osto Sr, Tiago Verissimo )  que rodeava o quartel da Mamarrosa. Tínha regressado a casa e após algumas horas de sono despertei com o barulho que, posteriormente, soube  ser das balas que choviam na chapa de zinco do telhado por cima da minha cabeça. Bêbado de sono, ( na farra até altas horas ) até pensei que se fritavam ovos na cozinha ao lado do quarto onde dormia. O barulho das morteiradas empurrou-me para a realidade: ‘Estamos a ser atacados!’
Durante quase uma hora estivemos debaixo de fogo. Valeram-nos os obuses de 12 e 16 mm e o 1º cabo da BTR que fez disparos certeiros para o morro de onde provinha o ataque. Só o clarear do dia trouxe a aviação.
O 4º  grupo da Companhia de Cavalaria 8453 estava destacado para uma operação nesse 24 de Julho. Por isso receberam ordens para levantarem ração de combate e fazerem  o reconhecimento ao local donde provinham as balas. A ousadia da nossa juventude e os aviões portugueses que nos sobrevoavam deram-nos a coragem. No cimo do morro encontrámos munições, armas e buracos das granadas dos obuses, bem como elementos do inimigo mortos.
Ainda não refeitos, no dia 29, confirmou-se que as informações da então D.G.S. (PIDE) de que continuava iminente um ataque eram bem verdade.
No Luvo ao anoitecer um comboio parou no lado de lá da fronteira e só retomou a marcha meia hora depois. Por volta da uma da manhã, do outro lado da fronteira, foi disparado um very-light que iluminou todo o destacamento. Seguiu-se uma orquestra de estrondos acompanhada por clarões de granadas de morteiro e canhão que caíam a quatro quilómetros.
Estávamos a ser atacados. Continuávamos a ter a ajuda dos obuses. A artilharia informara-nos que o inimigo  tinha já um grupo de assalto muito próximo, atrasado apenas pelos disparos de uma metralhadora. À informação donde provinha o ataque, os obuses varreram a zona. O bombardeamento foi constante e o inimigo  entrou em retirada, carregando grande parte dos seus mortos e feridos – muito armamento ficou para trás.
Esperámos que o dia amanhecesse e, mal a aurora se anunciou, avançámos com a coluna em direcção ao Luvo, carros atrás e os “Felinos”  à frente picando a estrada para detectar minas anti-carro ou anti-pessoal. Foram precisas duas horas para fazer quatro quilómetros. Chegámos. A zona estava armadilhada; os corpos dos homens – nossos e deles também – denunciavam a guerra.
Em Angola nem tudo foi terrível. Conheci pessoas por quem tenho uma enorme gratidão, fiz amizades cimentados pela circunstância da guerra mas também pelo convívio em Luanda, São Salvador ( MBANZA ) e Mamarrosa, e outros locais.

LOCAL

Algumas terras em Angola no tempo da colonização eram baptizadas com nomes de terras da Metrópole, nomes de origem dos fazendeiros que ali assentaram “arraiais”. Este nome é assim derivado da freguesia de Mamarrosa, concelho de Oliveira do Bairro, distrito de Aveiro, donde era natural o patrão da fazenda de café e de outros negócios em S.Salvador, de nome Salvador Beltrão. Nesta cidade, agora chamada de M´Banza Congo, existe ainda um prédio que era conhecido por “Prédio Salvador Beltrão”, onde havia um restaurante e uma drogaria. Certamente não haverá militar que não tenha entrado lá das muitas vezes que ia à capital para reabastecimento ou nas colunas do MVL.
                                      Aqui está a foto do Local (Prédio de Salvador Beltrão)


Mamarrosa fica situada 58 Km a norte de S.Salvador do Congo, 6 km a sul do Luvo (fronteira com a República Democrática do Congo), a Oeste temos Canga a 23 Km e Magina fica a 42 Km para Este. Está uma placa à saída do aquartelamento que indicava estes percursos.
As instalações militares da Mamarrosa ficavam numa colina onde no ponto mais alto estava situada a messe dos oficiais (edifício com o nome “MAMARROSA” gravado no telhado). Esta era a vista do local, vendo-se à direita o comando e a secretaria e à esquerda o posto médico e a enfermaria. A população civil (trabalhadores da fazenda do café) situava-se no lado oposto, na parte mais baixa da colina.


                                  Tropa de intervenção no Bairro Popular 1974

Nome:  Desconhecido

  TESTEMUNHO
‘FELINOS’ ESTIVERAM NA MAMARROSA E NO LUVO
Parti para Angola em Agosto de 1973 na Companhia de Cavalaria 8453, ‘Os Felinos’. Era furriel miliciano, formado na EPC de Santarém, tendo formado companhia no RC4 em Santa Margarida. Fomos para Mamarrosa/ Luvo, no Norte de Angola, na fronteira com a República Democrática do Congo (Zaire). no total éramos 30.
Com o tempo a passar sobre o 25 de Abril de 1974 e devido à indecisão de Portugal sobre o futuro de Angola, a FNLA atacava em força. Na noite de 24 de Julho de 1974 o nosso aquartelamento da Mamarrosa, onde se encontrava a minha companhia ‘Os Felinos’, foi atacado com armas automáticas, morteiros e canhões sem recuo. Devido a actos de bravura e coragem, ao clarear do dia o inimigo pôs-se em fuga. Em 29 de Julho de 1974,  a FNLA cercou o nosso pequeno destacamento do Luvo, junto à fronteira, e desencadeou um brutal ataque com a intenção de o tomar de assalto. Mas ‘Os Felinos’ reagiram com arrojo e audácia e o inimigo foi heróica e corajosamente rechaçado.
Nome: Amílcar Fontes
  Angola, Julho de 1974

TESTEMUNHO 
Nunca me poderei esquecer desse ataque, eu estava em minha casa jogando às cartas com O Alferes e 2 Furriéis  ( Quim Varela os  outros já não me lembra) e o  meu cão chamado Banza ladrava  imenso e eu mandava-o calar e não me obedecia e houve um dos presente que disse: “olhe que ele deve estar a pressentir alguma coisa” na verdade era isso, o inimigo já lá estava instalado.
O ataque sucedeu, a descrição aqui feita é correctissima. Eu durante o meu serviço militar nunca ouvi um tiro e foi preciso na vida civil, como Administrador de Posto do Luvo, ter que pegar na Mauser e refugiar-me na vala.
Depois do ataque, como se deve lembrar, vocês colocaram minas junto do arame e o meu cão “Banza” um dia quando jogavamos futebol naquele pequeno campo junto da Administração, tropeçou no arame e despoletou uma mina morrendo de imediato.
Recordar é viver.
Nome:  Tiago Veríssimo
       Angola, Julho de 1974



Tiveram de fazer patrulhamentos de segurança no Bairro Popular, hoje chamado de (Neves Bendinha) é um dos nove municípios que constituem a área urbana cidade de Luanda,  na província do mesmo nome  em Angola,  Kilamba Kiaxi tem 64,1 km² e cerca de 234 mil habitantes. Limita a Oeste com o município da Maianga, a Norte com os municípios do Rangel e Cazenga, a Este o município de Viana e a Sul com o município da Samba. É constituído pelas comunas do Neves Bendinha, Golfe, Palanca, Havemos de Voltar, Vila Estoril e Camama.A designação do município significa, em Kimbundo , Terra (Kiaxi) de Agostinho Neto  (chamado pelo povo de Kilamba cujo significado em kimbundo é "condutor de homens").  Coincidência ou não, vim encontrar no Bairro Popular nº 2 nas chamadas tropas de Intervenção alguns soldados que estiveram em Mamarrosa, patrulhamento também no Aeroporto de Luanda. A Companhia de Cavalaria 8453 regressou a Lisboa a 30 de Janeiro de 1975. Estiveram em Angola 17 meses .

                            Aquartelamento da Companhia de Cavalaria 8453“OS FELINOS”

Lembro-me que nessas instalações militares estavam muitos açorianos recrutados no BII 17 em Angra do Heroísmo e que por aqui passaram, pois num monumento que lá deixaram prova isso mesmo. “Antes morrer livres que em Paz sujeitos” era o lema daquele batalhão da ilha Terceira. Na foto, vê-se ao fundo o edifício da messe dos oficiais.
Foi aqui que cheguei em 09/07/1974, depois de percorrer cerca de 550 Km desde Luanda. A Carrinha DATSUN 1200 do Gama já estava cansadita e as estradas não eram muito boas a primeira etapa terminou em Ambrizete onde pernoitamos, tendo passado por Ambriz e Mussera. No segundo dia passámos em Tomboco, Xamindele, Cumbi, Luanica, S.Salvador. A 8 de Agosto de 1974 fizemos o mesmo caminho de regresso para Luanda, onde estive até ao dia 21/06/1975. Estes 10 meses foram apesar dos sobressaltos e dos tiros que havia em Luanda foram vividos intensamente, trabalho, praia na ilha, cucas e nocais na Portugália e no Bar do Matias,  (pedíamos bitoques para poder beber 2 cervejas)  ainda fui a Nova Lisboa, mais propriamente a Monte Belo em Vila Teixeira da Silva ( hoje Bailundo ), tendo embarcado para o  “Puto”  a 21 /06/1975, fazendo  9 horas de viagem num Jumbo da TAP com minha mãe e irmã!


ZÉ ANTUNES




TESTEMUNHO
Do segundo ataque ao Luvo em 24 e 29 de Julho de 1974, aquando dos ataques ao quartel de Mamarrosa e ao destacamento do Luvo,  recordo-me que tinha acabado de anoitecer e que estava sentado numa das mesas do refeitório, a ver o padeiro tirar o pão do forno, juntamente com o alferes Igrejas (o comandante), o enfermeiro que era o Pedro Pereira ou o Toni Araújo, e mais alguém, quando ouvimos um tiro vindo de perto do arame farpado, a que se seguiu intenso tiroteio e rebentamentos vindos dos morros de cá e de lá da fronteira.
Corri para o posto de transmissões e ao atravessar a parada fui projectado por um rebentamento, o que me deixou desfalecido e a sangrar, apesar de não saber onde estava ferido.
Levantei-me e consegui chegar ao meu posto (era o único operador) e entrei em contacto com o alferes Igrejas que estava na cova do morteiro 81 e tinha o “banana” (o AVP-1 para os aviões) e também com a Mamarrosa e o subsector de Cuimba que não paravam de perguntar o que se passava. Das peripécias por que passei lembro-me do alferes me ter pedido para ir à procura do enfermeiro atrás do posto de rádio e da enfermaria, para socorrer alguém ferido e de alguém me ter tomado por um turra e ter disparado sobre mim, o que me fez pensar que era    mais útil vivo do que morto e pirei-me.
Da Mamarrosa tive que travar os obuses, pois os companheiros da artilharia tinham-se baralhado nas coordenadas e os projécteis estavam a cair quase em cima de nós.
Depois do ataque reparei que inconscientemente tinha posto o rádio debaixo da mesa de tampo grosso e me tinha colocado debaixo dela, além do facto de ter enfiado os carregadores da G3 dentro das calças, talvez para estarem mais à mão.
Pelo meu lado, os ferimentos saldaram-se em profundas esfoladelas nas pernas, um ferimento dorsal de estilhaço ou bala de raspão e ainda um ferimento superficial nas costas.
Portanto,  os  ferimentos  não  foram  de  grande  importância,  apesar de me terem ligado as pernas como a uma múmia.
Com o nascer do dia e a chegada das colunas de socorro fui tomado por um herói e quiseram-me evacuar para Luanda.
Um abraço para todos
Nome:  José Sampaio                        Angola, Julho de 1974



TESTEMUNHO
A Companhia de Cavalaria 8453,  chegou a Luanda em Agosto de 1973, com destino a norte. Na Mamarrosa ficaram três grupos de combate, reforçados com um pelotão de artilharia de Ambrizete e ainda uma secção de morteiros pesados. No Luvo, posto fronteiriço com a República do Zaire a cerca de 10 km de Mamarrosa, ficou outro grupo. Mamarrosa e Luvo, situados num vale e ladeados pelas serras da Canga e da Danda e Pedra Verde, eram um ponto de infiltração de guerrilheiros da FNLA, com destino a acções e combates no Dembos. A nossa missão consistia em defender a Mamarrosa de ataques da FNLA e proteger a sanzala e a roça de café aí existentes.
Sofremos um forte ataque em 24 de Julho, mas sem baixas. A FNLA, que não estava em negociações de paz, tinha intensificado a luta armada nas zonas fronteiriças, para aí instalar as bases para a guerra civil.
Em 28 de Julho, quando estava com um grupo em operação de reconhecimento próximo do destacamento de Luvo, detectámos movimentos estranhos na zona, estando nós a cerca de 50 metros de distância do inimigo e sem comunicações. Foram cinco horas de sofrimento e ansiedade mas acabámos por saber, via rádio, que naquela noite estava a ser preparado pela FNLA um ataque ao Luvo, com a finalidade de expulsar os militares portugueses. Era uma hora da madrugada quando demos entrada no destacamento. Mas o ataque não foi naquela noite mas na seguinte, a 29 de Julho de 74. Foi um ataque feroz – de 300 homens da FNLA  a 70 portugueses que ripostaram e o repeliram de forma heróica. Não tivemos qualquer baixa, mas causámos muitas. Em Dezembro A Companhia de Cavalaria 8453 regressou a Luanda durante um mês e uma semana. Não foram férias. Já estava instalada a guerra civil entre o MPLA e a UNITA.

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